Mosteiro Zen é exemplo desenvolvimento regional sustentável na microrregião do Rio Doce
Mais do que gerar renda, é preciso distribuí-la de forma equânime e fazê-la chegar especialmente à população mais vulnerável.
Um pacto pela prosperidade de um território, seja ele uma comunidade, uma região ou um estado inteiro, requer criatividade e coragem para inovar, identificando identidades locais e construindo arranjos produtivos que insiram a sociedade como um todo em um movimento de crescimento econômico comprometido de fato com a conservação e recuperação dos ativos ambientais e culturais e com a coesão social.
Complexo na descrição, funcional e bonito na prática.
Na chamada microrregião do Rio Doce, que compreende os municípios de Aracruz, Ibiraçu, João Neiva, Linhares, Rio Bananal e Sooretama, o Mosteiro Zen Budista Morro da Vargem, em Ibiraçu, é um excelente exemplo da viabilidade desse modelo de Desenvolvimento Regional Sustentável orquestrado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN).
O turismo religioso, a educação ambiental, o incentivo aos plantios e construções de bambu e a geração de emprego e renda qualificados são algumas das ações em curso. Algumas, há trinta anos, outras, em estágio inicial de implantação.
“É preciso chegar à base da pirâmide”, indica Daiju Sam, abade do Mosteiro Zen, ao comentar a fábrica de cerâmica, projeto acalentado pelo monge há dez anos e cujas aulas devem se iniciar em setembro.
O prédio é projetado pelo arquiteto Guilherme Mendes da Rocha – conhecido como um "novo" Oscar Niemeyer – a coordenação técnica é da ceramista Kimi Nii e as aulas serão do professor Marcio Moura, que está de mudança de Salvador, na Bahia, exclusivamente para cuidar do projeto, que tem cunho social.
As turmas serão de aproximadamente vinte alunos, selecionados entre os mais economicamente vulneráveis, como mulheres chefes de família e jovens em áreas de risco social. Serão cursos exclusivos em todo o país, uma formação plena na arte da cerâmica japonesa de alta temperatura. “É uma cerâmica de luxo, com alto valor agregado”, define o abade. “Vai levar renda de verdade pra quem precisa”, enfatiza.
Diálogo inter-religioso
A região do entorno do mosteiro será a primeira a ser atendida com as peças, que podem equipar pousadas e restaurantes que atendem ao turismo religioso em crescimento. Os Caminhos da Sabedoria, lembra, foi a primeira rota de turismo religioso do país, criada há 31 anos, quando só havia Santiago de Compostela, na Europa, e o Shikoku Henro, no Japão, com seus 88 templos.
Aqui, esse diálogo religioso entre o Budismo e o Cristianismo passa por comunidades quilombolas, paisagens belíssimas, numa rota de 108 km, possível de ser cumprida a pé em três ou quatro dias, ou em menos tempo em veículos motorizados. “Todo mês as agências de turismo trazem grupos de todo o Brasil pra fazer essa caminhada”, diz Daiju Sam.
Os Caminhos passam também, obviamente, pela praça construída pelo Mosteiro às margens da BR 101. “Aquela praça está se tornando um grande equipamento público” comemora. “Hoje tem famílias que passam a tarde ali, trazem mesas e cadeiras, bolas de soprar, fazem aniversários, depois guardam tudo e voltam pra casa”, descreve.
O crescente de visitação se deu à medida que novas artes incrementavam o espaço. Primeiro foi o Torii, o portão sem portão (foto abaixo), que já se tornou marca do município. Depois, o jardim zen – jardim seco, com areia e pedriscos – o segundo maior do mundo, atrás apenas de Quioto, no Japão, que tem 1,2 mil anos e é tombado como patrimônio da humanidade pela Unesco.
Em seguida, o paisagismo e os quinze budas, que de fato passaram a “convidar” as pessoas a adentrarem a praça. “Antes elas fotografavam o portal, de fora”, relata.
A nova peça em construção é o buda gigante, de 33 metros, que deve ser inaugurado ainda em 2019. É a maior estátua de Buda em todo o Ocidente e a terceira maior do mundo – os dois primeiros estão na Ásia, continente com maior tradição budista.
Dinamismo
Quando se instalou em Ibiraçu, há meio século, o Mosteiro viu o município sofrer uma queda imensa na arrecadação e geração de renda. Com a Aracruz Celulose, o comércio e os departamento de governo migraram para Aracruz, deixando Ibiraçu em abandono. “Agora estamos trazendo elementos novos pra dinamizar a economia e promover o diálogo inter-religioso”, acentua,
“O Mosteiro é um dos exemplos que a gente quer enaltecer, com um modelo de desenvolvimento alternativo, que mostra como o Espírito Santo é uma diversidade de culturas muito rica. Com esse espírito é possível recuperar a região do Vale do Rio Doce”, qualifica a economista Eduarda La Rocque, diretora de Estudos e Pesquisas do Instituto Jones e idealizadora do Desenvolvimento Regional Sustentável e do Pacto pela Prosperidade.
A iniciativa está conectando inovações em todos os setores, incluindo o cultural, com o ES+Criativo e o Cultura Conecta. Além da Secult, outras secretarias de Estado e autarquias – Direitos Humanos, Justiça, Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento, Meio Ambiente, Habitação, Turismo, Incaper, Idaf, Aderes – já estão diretamente envolvidas, com seus respectivos gestores “apadrinhando” cada uma das microrregiões.
“São muitas potências”, testemunha Eduarda. E a ideia é “´potencializar o que já existe”, ativando “centros propulsores de prosperidade”, voltados para o “desenvolvimento sustentável holístico, que preserva o meio ambiente”, explana.
“Precisamos de projetos que sejam instrumentos de renovação urbana e desenvolvimento ordenado do entorno”, diz. O turismo por exemplo, ressalva a economista, pode produzir especulação imobiliária predatória, como o que está acontecendo em Santa Teresa, município vizinho a Ibiraçu e integrante da rota das Três Santas.
Bambu
Do urbano ao rural, Daiju Sam insiste na necessidade de olhar para os mais pobres economicamente. “Desenvolvimento e renda para o homem no campo”, mantraliza. Nesse sentido, o projeto do Bambu segue evoluindo. Depois de visitas a países com excelência na cultura do bambu, como Colômbia, o monge continua suprindo os produtores rurais de Ibiraçu com informações, como palestras e mudas. Eles continuam plantando o babmbu em suas propriedades, principalmente, da família Guadua, originária da Amazônia, mas perfeitamente adaptada à Mata Atlântica.
“Temos que ter a matéria-prima. Em breve começarão as construções com bambu”, anuncia, citando obras públicas e privadas, visto que a Prefeitura de Ibiraçu já aderiu à iniciativa, além da Secretaria de Estado de Turismo, e o Sebrae, que já se aproxima. “Pousadas e restaurantes em bambu e cerâmica japonesa”, vislumbra.
Conselhos
Além do Rio Doce, o Projeto Desenvolvimento Regional Sustentável do Espírito Santo está criando Conselhos Regionais de Desenvolvimento em mais oito microrregiões: Nordeste, Noroeste, Centro-Oeste, Central-Serrana, Sudoeste Serrana, Caparaó, Central Sul e Litoral Sul, sendo que na microrregião Metropolitana o projeto será executado pelo Conselho Metropolitano de Desenvolvimento da Grande Vitória (Comdevit), já existente.
Com a instalação do Conselho do Rio Doce, nesta quinta-feira (15), restarão apenas o Norte e o Noroeste que serão implantados até setembro. Desde julho, as primeiras reuniões dos conselhos regionais pioneiros já estão sendo realizadas.
A criação dos conselhos foi precedida pela configuração de um panorama regional do estado, considerando treze indicadores: área da microrregião, população estimada, densidade demográfica, Produto Interno Bruto (PIB), composição do PIB Setorial, PIB Per Capita, Receita Corrente Líquida (RCL) Per Capita, Indice Firjan de Emprego e Renda, Índice Firjan de Saúde, Índice Firjan de Educação, abastecimento de água, coleta de lixo e coleta de esgoto.
Carros-chefe do Projeto, que conduzem a criação do Índice de Prosperidade do Espírito Santo (IPES), os conselhos de desenvolvimento regional sustentável “têm por responsabilidade a criação de um ambiente de articulação, integração e pactuação de interesses regionais”, assevera o Instituto Jones, em seu site.
Ambiente de articulação
O Plano Regional de Desenvolvimento foi lançado pelo Governo do Estado no dia 10 de abril, em Cachoeiro de Itapemirim e conta a gestão conjunta da Secretaria de Estado de Desenvolvimento (Sedes) e da Secretaria de Economia e Planejamento (SEP).
A secretaria técnica é feita pelo Instituto Jones dos Santos Neves, em conjunto com a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação Profissional (Secti) e instituições de ensino e pesquisa de cada macrorregião. Já a coordenação-executiva está a cargo do subsecretário de Desenvolvimento (Sedes), Paulo Menegueli.
As reuniões para criação dos conselhos aconteceram, até agora, em paralelo com as audiências do Plano Plurianual (PPA) 2020-2023 e do Orçamento Participativo 2020, que também foram realizadas nas mesmas dez microrregiões. Em 2020, na repactuação do PPA, será possível aproveitar os indicadores do IPES para ajustar as prioridades regionais e melhor direcionar os investimentos públicos.
Texto: Século Diário
_Publicado originalmente em: hhttps://seculodiario.com.br/public/jornal/materia/pacto-pela-prosperidade-requer-criatividade-e-distribuicao-de-renda_