Por Julia Uliana, Amanda Koffer e Latussa Monteiro
Problemas de mobilidade urbana significam, sobretudo, falta de acesso aos serviços e estruturas da cidade. Podem também envolver questões como infraestrutura, qualidade e custos de serviço de transporte público, emissões de gases do efeito estufa e acidentes com vítimas.
Nesse contexto, em março de 2023, foi lançada a “Coalizão Mobilidade Triplo Zero”, uma rede de organizações que tem como objetivo promover soluções para reduzir a desigualdade e melhorar a qualidade ambiental nos deslocamentos em consonância com a Proposta de Emenda Constitucional n. 25/2023 que reivindica o SUM – Sistema Único de Mobilidade.
O sistema integraria os governos federal, estadual e municipal para contribuir com os custos e gestão do transporte público nas cidades e garantir o direito social ao Transporte, de maneira similar ao Sistemas Únicos de Saúde (SUS) e de Assistência Social (SUAS).
O triplo zero possui como objetivos: (1) zerar as tarifas do transporte público coletivo por meio de financiamento público, (2) zerar as emissões de poluentes através de modais de locomoção mais sustentáveis e (3) zerar as mortes no trânsito mediante infraestrutura adequada dos serviços.
A temática esteve em voga durante as manifestações de junho de 2013 e levou a Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV) ao retorno do sistema aquaviário de transporte, sendo também um dos eixos prioritários do Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (Lei Complementar 872/2017).
Na RMGV, o Sistema Transcol (Transporte Coletivo da Grande Vitória) assegura a integração física e temporal dos meios de transporte coletivo pelo Bilhete Único Metropolitano, e garante a isenção total ou parcial de pagamento conforme suas normativas.
Além disso, a tarifa zero também é adotada em circunstâncias que facilitem o acesso ao transporte público coletivo, como aconteceu em 2022, nos dias de votação para o segundo turno das eleições, e de aplicação de provas do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio).
A tarifa zerada impacta de modo direto – e positivamente – na economia, cultura e ambiente, pois fomenta o comércio, o consumo e o lazer por permitir a uma significativa parcela da população o acesso a equipamentos de saúde, educação, cultura e entretenimento e assim minorar os efeitos da segregação espacial expressa na desigualdade das condições ambientais e urbanas.
A necessidade de zerar emissões responde ao fato de a mobilidade ser também um instrumento necessário para a mitigação da crise climática. O último Inventário de Fontes de Emissões Atmosféricas divulgado pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema, 2015) indica que 25% dos gases presentes na atmosfera da Grande Vitória são provenientes de vias de tráfego, sendo 7% de emissões veiculares e 18% de ressuspensão de partículas devido à sujidade das vias.
Apesar da relevante participação, a frota automotiva cresce anualmente na RMGV correspondendo atualmente a 47% dos veículos do estado, onde 9 em cada 10 veículos são carros particulares.
A diminuição dos deslocamentos por transportes individuais motorizados é chave para o enfrentamento à emissão de gases por redução da poluição. Para tanto, é necessário incentivar a mobilidade ativa, principalmente com a ampliação de infraestruturas que garantam o uso em segurança e a disponibilidade de equipamentos tais como bicicletas e patinetes.
Nesse sentido, é importante enfatizar a necessidade de integração de ações de planejamento, operação e gestão com controle social que permitam avançar em direção ao terceiro objetivo da coalizão: zerar acidentes de trânsito. Reforçar a ideia de cidades para pessoas em condições de acesso caminhável às principais infraestruturas e serviços urbanos deve estar aliado ao acompanhamento atento das ocorrências com vítimas como subsídio a modificações no sistema viário, na sinalização e na fiscalização de trânsito.
Considerando o panorama da RMGV, é essencial priorizar os incentivos à mobilidade a pé e cicloviária para a melhoria contínua das condições atuais. Ações como: viabilização de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas; padronização de calçadas e vias acessíveis; aumento da sinalização e fiscalização; e integração dos meios não motorizados ao sistema de bilhetagem eletrônica; são algumas medidas urgentes e necessárias para alcançar a mobilidade como direito social.
Rumar ao triplo zero consiste em garantir a universalização do direito e do acesso ao transporte e à mobilidade urbana de modo democrático, seguro e confortável, melhorando a qualidade de vida das cidades e contribuindo também para mitigar a crise climática.
Julia Curto Uliana é doutoranda em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU-UFES) e bolsista pesquisadora do Observatório das Metrópoles/IJSN
Amanda Lovatti Coelho Koffer é mestra em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU-UFES) e bolsista pesquisadora do Observatório das Metrópoles/IJSN
Latussa Laranja Monteiro é doutora em Arquitetura e Urbanismo, Professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFES e pesquisadora do Observatório das Metrópoles – Núcleo Vitória